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O DECLÍNIO DO AVIVAMENTO PENTECOSTAL NO BRASIL – parte 3

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Movimento Periférico

Já vimos, no artigo anterior, o que significa dizer que o avivamento pentecostal no Brasil foi um movimento.

Mas, na sua felicíssima análise, o pastor José Gonçalves enfatiza que este movimento foi um movimento “periférico”, ou seja, um movimento que teve sua ocorrência na “periferia”.

“Periferia” é palavra grega que significa “circunferência”, no sentido de “fora do centro”, tanto que também tem o significado de “região afastada do centro urbano de uma cidade, em geral carente de serviços e infraestrutura, que abriga grande parte da sua população econômica e socialmente desfavorecida; conjunto dos países pouco desenvolvidos em relação às grandes potências, estas consideradas como centro de um sistema socioeconômico mundial”.

O avivamento pentecostal não ocorreu no “centro da sociedade”, não foi um movimento que tenha acontecido a partir das “lideranças eclesiásticas”, mas algo que se iniciou no meio da população mais simples, como vemos na história das denominações pentecostais, quando observamos que a pregação pentecostal do Evangelho foi dirigida, primeiramente, às camadas pobres da população, aos desvalidos e aos despossuídos de bens materiais.

Verdade é que o Espírito Santo mandou os missionários pioneiros das Assembleias de Deus para Belém do Pará, que vivia, naquele tempo, o chamado “ciclo da borracha”, que já se encaminhava para o seu final, local onde havia pessoas de várias partes do país, precisamente para que, com o término deste “boom econômico”, as pessoas saíssem para outros locais, já levando a mensagem do Evangelho completo.

Agia, assim, o Espírito Santo da mesma forma que o fez no dia de Pentecostes, onde a mensagem do Evangelho já saiu, de pronto, disseminada às nações para onde retornaram os peregrinos que creram na mensagem da salvação em Cristo Jesus (At.2:5).

Esta qualidade “periférica” é mais uma demonstração de que o pentecostalismo foi uma ação do Espírito Santo, não dos homens, e que, portanto, não pode ser explicada pelo raciocínio humano.

O pentecostalismo seguiu o modelo bíblico, que é um modelo centrífugo, ou seja, que parte do centro para a periferia, como determinou o Senhor Jesus, que mandou que Seus discípulos fossem testemunhas desde Jerusalém até os confins da terra (At.1:8), uma “Igreja em saída”, como disse, por incrível que pareça, o Papa Francisco em sua primeira exortação apostólica, escrito em que aproveitou, inclusive, um rascunho de seu antecessor Bento XVI[1].

Inclusive, por ser um movimento “periférico”, passou a ser perseguido pelo “centro”, pela elite da sociedade, a começar da Igreja Romana, e por autoridades civis.

Sendo um movimento periférico, o pentecostalismo não pode, jamais, abandonar a periferia, não pode querer fazer parte do “centro da sociedade”, não pode almejar compartilhar do “centro do poder”, mas, sim, permanecer na “periferia”, não se comprometendo com o mundo nem com as suas estruturas sócio-econômico-políticas, que estão todas no maligno (I Jo.5:19).

Notemos que os discípulos, mesmo quando ainda em Jerusalém, mantinham-se na “periferia” daquela cidade, encheram a capital dos judeus da doutrina de Jesus (At.5:28), estando nas ruas e caminhos a levar a mensagem da salvação em Jesus (At.5:15,16) e, no templo, estando num lugar marginal, à parte, onde não se confundiam com os demais frequentadores daquela casa de oração (At.5:12,13).

Apesar disto, sua influência chegava ao “centro”, tanto que muitos dos sacerdotes passaram a obedecer à fé (At.6:7).

A ação do Evangelho não está circunscrita a estruturas sociais, alcançando a todos os que creem, pertençam eles às camadas mais simples e que se encontram no piso da sociedade, pertençam eles à elite da sociedade, às classes dirigentes.

No livro de Atos dos Apóstolos, que é o modelo bíblico da evangelização e de igreja, sendo um livro a um só tempo histórico e prescritivo, vemos que o Evangelho alcançou desde os mais simples, desde os escravos (que eram a maioria na igreja, até porque eram a maioria na sociedade de então – Cf. Ef.6:5-8) até altas autoridades do Império Romano, como o procônsul Sérgio Paulo, por exemplo (At.,13:7,12).

No entanto, deve a Igreja, e o pentecostalismo no Brasil o fez, manter-se como “movimento periférico”, ou seja, como um movimento que, tendo ido até a “periferia”, dali parta para o centro da sociedade, ganhando ali também almas para Cristo, mas jamais querendo ali se estabelecer, jamais querendo ali fincar a sua base, pois o reino de Deus não é deste mundo (Jo.18:36).

Na “periferia”, o avivamento que, como todo avivamento é obra exclusiva do Espírito Santo, havia as condições adequadas para que se mantivessem os crentes na total dependência divina, já que não havia qualquer fator em que se pudesse apegar ou confiar a não ser no Senhor.

É bem por isso que o pastor José Gonçalves diz que este “movimento periférico” conquistou relevância, reconhecimento e prestígio graças ao poder do Espírito Santo.

Desde quando agiu nos pioneiros, trazendo-os para o Brasil, o Espírito Santo sempre encontrou liberdade de atuação nos crentes, que, movidos pela Sua direção, não deixavam de obedecer-Lhe a voz e de pregar o Evangelho, confirmando o Senhor a Palavra com os sinais que se seguiram.

Assim como ocorreu nos dias apostólicos, os discípulos não deixavam de pregar o Evangelho, levando a mensagem para onde quer que fossem. Deste modo, não só os missionários pioneiros e os que, depois deles, vieram para o Brasil, evangelizavam como também todos os membros não deixavam de anunciar a Jesus Cristo.

Eis a mui feliz análise deste grande estudioso das Escrituras: “O pentecostalismo começou como um movimento periférico que, graças ao poder do Espírito Santo e ao forte comprometimento de seus líderes fundadores, conquistou relevância, reconhecimento e prestígio. Contudo, aquilo que foi conquistado por força de intervenções sobrenaturais e muitas lágrimas derramadas dá sinais de arrefecimento e esvaziamento. A meu ver, na base desse esfriamento estão o secularismo e consumismo que transformaram igrejas em casas de shows e entretenimento; o institucionalismo, que fomentou disputas por espaço e poder, transformando algumas Convenções em verdadeiras Prefeituras; e o afrouxamento ético e doutrinário, que mundanizou muitas igrejas e as converteu em meros clubes sociais. Fica o alerta bíblico: ‘Não apagueis o Espírito’ (I Ts.5:19).”

Mas como se comportavam as lideranças? É o que veremos na sequência.


[1] “I. Uma Igreja «em saída» 20. Na Palavra de Deus, aparece constantemente este dinamismo de «saída», que Deus quer provocar nos crentes. Abraão aceitou a chamada para partir rumo a uma nova terra (cf. Gn 12, 1-3). Moisés ouviu a chamada de Deus: «Vai; Eu te envio» (Ex 3, 10), e fez sair o povo para a terra prometida (cf. Ex 3, 17). A Jeremias disse: «Irás aonde Eu te enviar» (Jr 1, 7). Naquele «ide» de Jesus, estão presentes os cenários e os desafios sempre novos da missão evangelizadora da Igreja, e hoje todos somos chamados a esta nova «saída» missionária. Cada cristão e cada comunidade há-de discernir qual é o caminho que o Senhor lhe pede, mas todos somos convidados a aceitar esta chamada: sair da própria comodidade e ter a coragem de alcançar todas as periferias que precisam da luz do Evangelho. (Exortação apostólica Evangelii Gaudium. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/apost_exhortations/documents/papa-francesco_esortazione-ap_20131124_evangelii-gaudium.html Acesso em 21 fev. 2023).

Caramuru Afonso

Evangelista da Igreja Evangélica Assembleia de Deus - Ministério do Belém - sede - São Paulo/SP, onde é o responsável pelo Estudo dos Professores e Amigos da Escola Bíblica Dominical e professor de EBD. Doutor em Direito Civil e Bacharel em Filosofia pela USP. Juiz de Direito em São Paulo